Com 40 semanas e 3 dias
de gestação, no dia 22 de abril, acordei durante a noite com uma contração.
Como senti muitas contrações durante praticamente toda a gestação, nem me
importei. Levantei-me, fui ao banheiro, voltei para a cama e adormeci. Acordei
pouco tempo depois sentindo outra contração. Então percebi que aquela contração
era diferente, mais dolorida e capaz de me despertar. Me sentei na cama
e peguei o iPad, onde já tinha instalado um aplicativo que marca a duração e
frequência de cada contração.
Eram 4h20, e as contrações continuaram, duravam
cerca de um minuto e meio, e vinham praticamente a cada oito minutos. Pouco
tempo depois comecei a ir ao banheiro. Não tive diarreia, mas fui ao banheiro
diversas vezes. Já a minha mãe que veio do Paraná para me ajudar, teve diarreia
assim que soube que eu estava em trabalho de parto.
Eu planejava fazer muitas
coisas durante o trabalho de parto, precisava forrar o colchão com plástico,
tomar banho, me depilar, lavar a cabeça, secar, fazer as unhas (já tinha
deixado as unhas postiças preparadas, cortadas, lixadas e com uma demão de
esmalte), e queria pelo menos passar um corretivo nas olheiras e uma máscara de
cílios pra não ficar com cara de acabada nas fotos. Também queria fazer bolo, eu mesma achava que estaria boa pra ajudar meu marido a mudar os
móveis da sala de lugar e ajudar a encher a piscina inflável. Já teria colocado a playlist para tocar, então faria a decoração de uma mesinha com flores, velas e
aromatizantes, ao lado da piscina. Ah! Ao fazer tudo isso, eu esperava registrar cada detalhe com
fotos e publicar no instagram com a hastag #partoonline.
Parece muita pretensão,
mas com certeza conseguiria fazer tudo isso se o parto fosse pelo menos
parecido com o meu primeiro parto, que durou 28 horas da primeira contração até
o nascimento, e depois de passar a noite com contrações regulares a cada dez
minutos, passei o dia inteiro com contrações fracas a cada trinta ou quarenta minutos,
o que me possibilitou ter um dia normal, fazer muita coisa, inclusive fui para
a cozinha fazer pão e bolo. Só não consegui descansar por causa da ansiedade e
o descanso fez falta na fase final do trabalho de parto.
Dessa vez esperava que o
trabalho de parto fosse mais rápido, como normalmente acontece no segundo parto
com quem já teve o primeiro parto normal. Imaginava umas 12 horas no geral, e de
8 a 10 horas de parto ativo.
Apesar de ter planejado
fazer tantas coisas, eu já havia expressado meu desejo para a Josi, minha
doula, que fazia questão de eu mesma pegar o Kauai, que torcia muito para que o
Davi estivesse presente na hora do nascimento, e que todo o resto era frescura,
não me importava com mais nada.
As contrações continuavam
ritmadas, mas a todo momento eu achava que teria um descanso, então falei para
o Fabricio levar o Davi para a escola e ir trabalhar pelo menos até a hora do
almoço. Queria “deixar rolar”, não ter tudo sob controle, então deixei de
marcar as contrações quando o Fabricio saiu para levar o Davi.
Quando ele voltou achou
melhor não ir para o trabalho, fomos marcar novamente a duração e frequência
das contrações. Elas estavam na frequência de 5 minutos, mas o tempo de duração
diminuiu para menos de um minuto. Apesar de sentir que as contrações eram fortes,
por ter diminuído a duração, ainda achava que o trabalho de parto fosse
demorar.
Liguei para a Karina,
minha parteira, e ela falou que o trabalho de parto provavelmente iria engrenar
mesmo no final da tarde. Ela também avisou a Nathalie, sua auxiliar, e pediu para
a Josi, minha doula vir primeiro, ver como estava o processo e avisá-las quando
pudessem vir. Avisei também a Carla, a fotógrafa.
Assim que desliguei o
telefone não tive mais nenhuma contração com intervalo de 5 minutos, já
diminuiu para 4 minutos. Enquanto isso o Fabricio forrou o colchão, eu tomei
banho e tentei me depilar (o serviço ficou bem mal feito). Eu não consegui
ficar muito tempo no banho. Apesar da água quente ajudar a aliviar a dor, eu
estava sentindo um pouco de falta de ar, e tinha medo da pressão abaixar. Saí
do banho e o Fabricio me ajudou a secar o cabelo, mas desligava o secador em cada contração para massagear a minha lombar que doía muito durante as contrações. Só isso... Não consegui fazer
mais NADA! Nem tomei café (não conseguia comer), e até esqueci de escovar os
dentes.
Se você faz
questão de fazer as unhas e estar maquiada, com o cabelo escovado, sugiro que agende a sua
cesárea eletiva, caso contrário você pode correr o risco do seu parto ser uma
“tragédia”. Eu fazia questão apenas do mais importante, até queria mostrar que o trabalho de parto não é como nas novelas, mas na real só fazia questão que meu parto fosse do jeitinho que foi. Assim:
Eu ficava totalmente
sem reação no intervalo das contrações. Meu corpo pedia que eu ficasse apenas quieta, me recuperando antes que a próxima contração viesse. E assim fiz, ouvi e atendi o que meu corpo me exigia.
Durante a contração eu me concentrava na
respiração, respirava fundo e soltava o ar devagar.
A Josi chegou e o
Fabricio “rendeu seu posto” e foi organizar a sala, montar e encher a piscina. Eu
estava sentada na minha cama, que é daquele modelo oriental, baixinha, e
sentada fico quase de cócoras. A Josi (que está terminando o curso de
obstetrícia) pode verificar os batimentos cardíacos do Kauai, e também aferiu a
minha pressão. Nós dois estávamos bem. Então ela colocou a mão sobre a minha
barriga para sentir as próximas contrações. Estavam com intervalo de 3 minutos
e meio. Na terceira contração ela percebeu que eu estava fazendo força e
perguntou se eu já estava sentindo os puxos. Respondi que era a primeira vez
que sentia, e juntamente com esse primeiro puxo, fiz força e a bolsa rompeu,
senti o líquido amniótico escorrendo, olhei e estava clarinho. A Josi se levantou meio desesperada e ligou
para a Karina para avisar que todas já poderiam vir, pois percebeu que o trabalho de
parto já estava bem avançado. Mesmo assim eu pensava que ainda poderia
demorar...
Durante a contração eu me concentrava na
respiração, respirava fundo e soltava o ar vocalizando.
Por volta das 11h20 o
Fabricio deixou a piscina enchendo e foi buscar o Davi na escola, mesmo ainda
não sendo a hora de buscá-lo.
A cada contração sentia o
puxo, fazia força, e sentia mais líquido escorrendo.
No intervalo de uma
contração me levantei para tirar a calcinha e fui direto para a piscina, que
ainda não estava cheia, mas sentia que se eu voltasse para a minha cama não conseguiria
me levantar novamente.
Ao entrar na piscina
resolvi me tocar para ver se já dava para sentir a cabeça do Kauai. Não entrou
nem a ponta do meu dedo e senti algo duro. Me assustei. Ainda quis tirar a “prova real” e fiz
uma “pinça” com as pontas dos dedos para ver se poderia sentir os cabelos. E
realmente, "aquilo" duro que estava saindo de mim tinha cabelo! E somente nesse
momento que verdadeiramente me conscientizei que o trabalho de parto não se
estenderia até à tarde, que o Kauai estava prestes a nascer.
Eu realmente não estava
preparada psicologicamente para uma fase ativa de trabalho de parto tão rápida.
Estava feliz que não sentiria contrações até à tarde, feliz que em pouquíssimos
minutos teria o Kauai em meus braços, mas ao mesmo tempo também estava assustada.
A Karina chegou, e veio
imediatamente ver como estavam os batimentos cardíacos do Kauai. Ele estava
bem, e ao ver que ele já estava nascendo, percebeu que eu estava um pouco
ansiosa porque o Fabricio ainda não havia chegado com o Davi.
Foto: Fabricio Sena
A Carla também ainda não tinha
conseguido chegar, então a Karina perguntou da minha câmera, e eu respondi que
estava toda desmontada (guardada sem nenhuma lente).
As contrações vinham e eu
já começava a sentir uma ardência... O Kauai estava quase coroando... E, cadê
o pai dessa criança que não chega?!!!
Durante a contração eu tentava me concentrar
na respiração, respirava fundo e soltava o ar urrando como uma fera!
Foto: Fabricio Sena
Então, finalmente a porta
se abriu. Era o Fabricio trazendo o Davi em seu colo. Só falei: “Amor,
tá nascendo! Pega a câmera!”.
O Davi veio para perto da
piscina, e no começo estranhou meus gritos, mas eu já havia preparado o
caminho, falado tudo sobre o parto, mostrado vídeos e também as fotos do seu nascimento.
Já havia falado que sentiria dor e que provavelmente gritaria, mas que logo
passaria e que estaria bem. E no intervalo das contrações eu conversava com ele
e falava que estava tudo bem.
Foto: Fabricio Sena
Depois que eles chegaram
foram apenas seis minutos, só mais quatro contrações, e senti a cabeça do Kauai
coroando, saindo, assim como todo o seu corpinho. Senti com meu corpo, e senti com as minhas
mãos, que o ampararam, e o trouxeram para os meus braços.
Foto: Fabricio Sena
Às 11h46 o Kauai nasceu,
resmungou, depois fechou os olhos e ficou quietinho. Com o corpo submerso na
água quentinha, percebeu que não tinha mudado muita coisa, apenas o espaço
havia aumentado.
Foto: Fabricio Sena
Ficamos ali nos
conhecendo por um bom tempo... Éramos mãe e filho, mãe e filhos, pai e filho,
irmãos... Família!
Foto: Karina F. Trevisan
Ai que cheirinho bom de recém-nascido, cheiro de vernix! Estava com saudade de sentir esse cheiro, melhor que qualquer aromatizante, flores ou velas perfumadas que eu pudesse colocar! Ficamos embriagados de ocitocina, o hormônio do amor.
Saímos dali apenas quando
a água da piscina começou a esfriar. Fomos todos para o quarto. O Kauai mamou pela primeira vez, enquanto esperávamos o cordão parar de pulsar.
Foto: Fabricio Sena
A
placenta saiu inteira, analisaram o meu períneo, e tive que levar alguns
pontos.
Nesse momento a Nathalie e a Carla já haviam chegado. O cordão parou de pulsar, o Fabricio com o Davi o cortaram. Então o Kauai foi pesado: 3,600kg. Um bebezão!
(Meu filho, fiz tudo o que podia para te dar um nascimento digno e respeitoso. Você escolheu a hora exata de nascer. Não te arrancaram de dentro do meu ventre, não te pegaram de qualquer jeito, não te jogaram de um lado para outro sem nenhum cuidado, não te esfregaram com um pano para limpá-lo, não cortaram o cordão antes que parasse de pulsar e você teve tempo para aprender a respirar, não te deram vitamina K injetável, não pingaram nenhum colírio em seus olhinhos, não te aspiraram, não te mediram, só te pesaram depois de ter mamado, não te afastaram de mim, não te deram nenhuma fórmula ou água glicosada, não te deixaram num berçário "para observação", pois eu mesma não desgrudei os olhos de você o resto do dia. Missão cumprida!)
Foto: Carla Raiter
Eu pretendia simplesmente descartar a placenta (acho esse negócio de comer, fazer suco, uma "pegada" meio canibal), mas as meninas pediram um pote de sorvete para colocá-la e eu não tinha. Então minha mãe pegou uma lata de biscoitos em formato de coração, e a placenta ficou tão linda na lata, tão simbólica, parece que deu um significado maior. Me apeguei e pedi para que não fosse descartada.
Foto: Carla Raiter
Enfim consegui me alimentar e depois fui tomar um banho. Estava bem, um pouco cansada, um pouco fraca, mas não tive nenhuma tontura.
Enquanto me banhava o Davi e Fabricio pegaram o Kauai pela primeira vez.
Foto: Carla Raiter
Foto: Carla Raiter
Toda equipe foi embora e o dia continuou normalmente para todos, menos para nós: um bebê, um pai, uma mãe e um irmão mais velho recém-nascidos.
Foto: Carla Raiter
Passei o resto do dia extasiada, dando muito carinho, mamá e colo para o Kauai, e ouvindo a playlist que não consegui ouvir durante o trabalho de parto. E à noite adormeci, extremamente feliz, entre meus dois meninos.
Foto: Carla Raiter
Às pessoas que estiveram presente nesse momento tão especial: a Josi, minha doula querida, a Nathalie e a Karina (parteiras) que me aceitaram quando resolvi mudar de equipe já com 36 semanas de gestação, Carla, fotógrafa "ninja" (que ficou triste por perder o melhor da festa), minha mãe que veio para me ajudar (não sei o que seria de mim sem ela), e também o Dr. Alberto, que me proporcionou um pré-natal digno... Muito obrigada!
Veja o álbum de fotos AQUI.